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Ensinar e aprender sempre

Por Revista Caminhoneiro em 28/06/2016 às 22:08
Ensinar e aprender sempre

Os caminhoneiros que viajam têm a difícil missão de acompanhar os estudos dos filhos à distância. Telefone e internet ajudam, porém, além desse acompanhamento, precisam estar aprendendo constantemente as novas tecnologias embarcadas nos caminhões que dirigem. [gallery link="file" size="full" ids="3848,3842,3846,3841"] Dirigindo um Scania 440, de Colatina, ES, para São Paulo, Iélito Fernandes Freitas Júnior, de 33 anos e 13 de estrada, tem outra preocupação, além de entregar os grãos de café que transporta. Ele se preocupa com a educação de sua filha de nove anos que está na terceira série. “Eu estou separado da mãe dela, mas ajudo como posso, incentivando-a, perguntando sobre o colégio, sobre as notas. Sou um pai distante, mas não ausente”, afirma Freitas Júnior. “Eu ligo para ela, peço para falar com a avó que me conta tudo. Aviso que se não for bem na escola, não tem presente quando eu for visitá-la”. Com o segundo grau completo, ele sabe que atualmente, sem estudo não se consegue nada. Segundo ele, hoje tudo gira em torno do computador e é preciso estar atualizado. Fábio dos Santos Bentivoglio, de Passo Fundo, RS, pilota um Volvo FH 460 com o qual levou aveia até Viana, ES. Parado em um posto da rodovia Castelo Branco, espera o aviso para carregar grãos em Ourinhos, SP, e voltar para casa, de onde saiu há 15 dias, deixando uma filha de 12 dias com a mãe, com o irmão de 10 e com as irmãs de 13 e de 18 anos. “Estudei só até a 8ª série e com certeza se eu tivesse estudado mais, teria mais chances”, confessa Bentivoglio. “Eu poderia estar em casa, com a família. Aqui é bom, amo esse serviço de paixão, mas poderia estar em casa com a família se tivesse mais estudo”. A filha de 18 anos é muito ajuizada, já se formou em cabeleireira e montou um salão em casa. O menino de 10 anos e a menina de 13 estão na escola. “Mas essa parte é complicada, a gente precisa deixar com a mãe”, lamenta ele. “Eu monitoro por telefone, ligo, pergunto como estão as matérias das escolas, se está tudo certinho. Quando chego em casa, faço uma reunião em família, dou uma conversada, saio para fazer um lanche, pergunto como está a escola e incentivo o estudo”. Aguardando para carregar bobinas de papel para o Rio Grande do Sul, Angelim Monteiro Barreto, morador de Uruguaiana, RS, com 46 anos de idade e 24 de estrada, dirigindo um Scania 380, chegou de La Rioja, Argentina, com um carregamento de azeitona. Uma viagem de 2.800 km. Tem dois filhos crescidos, um de 19 e outro de 20 anos. Ambos estudam no Chile. O de 19 anos faz agronomia e o outro pedagogia. “Quando viajo para o Chile, faço questão de passar na casa deles, saber como estão, como vão indo na escola, e hoje com a tecnologia de internet, WhatsApp, fica mais simples se comunicar”. Barreto explica que apesar de não viver com eles, continua sendo pai e chama a atenção dos dois quando necessário. “Fiz só o primário. Na realidade, na época que comecei a trabalhar no transporte, éramos muito bem remunerados”, lembra com saudades. “Na atualidade, para quem está começando, eu não aconselho a profissão”. Ainda sem destino certo, Marcelo Alexandre de Melo, de 41 anos de idade e 23 como caminhoneiro, aguarda com um Iveco 410 para saber onde irá carregar. “Sou de Londrina, fui até Curitiba, carreguei com cerveja, descarreguei em um supermercado aqui em São Paulo e daqui só Deus sabe para onde vou”, diz sorrindo Melo. “Transporto produtos da Ambev e preciso ficar esperando o próximo destino. Estou aqui há três dias, mas não reclamo. Tenho um salário fixo, comissão e uma diária de R$ 60,00. A empresa é excelente, muito boa”. A filha de sete anos está na segunda série e ele procura auxiliar como pode nos estudos. “Às vezes pelo telefone, faço alguma tarefa com ela, procuro perguntar o que ela está aprendendo e confio muito na minha esposa. Minha mulher é uma ótima esposa e uma excelente mãe e eu preciso ficar nas estradas para dar um conforto a elas”. Melo estudou até o segundo grau, mas não se importa. “Acho que isso nunca me prejudicou porque eu nunca me vi realizando outra coisa. Gosto do que faço, amo minha profissão e não me vejo fazendo outra coisa”. Aprendendo sempre Mesmo não tendo muito estudo, todos os caminhoneiros reconhecem que não podem ficar parados no tempo, pois a evolução dos caminhões é constante. Todo dia tem uma nova tecnologia embarcada e quem não se atualizar, acaba perdendo o emprego e novas chances de crescer na profissão. “Aprendi com a lição da vida e fiz vários cursos de direção defensiva, direção econômica”, explica Melo. “A gente tem que correr atrás dos cursos, porque esses caminhões praticamente andam sozinhos”. Morar em outro país pode ser uma vantagem para se aperfeiçoar. É isso que aconteceu com Angelim Barreto, que morou muitos anos no Chile. “Lá existe uma variedade maior de caminhões e bem avançados”, explica ele. “Assim eu pude aprender muita coisa. Compensei minha pouca instrução lendo muito, me informando, procurando aprender tudo sobre caminhões e transporte e até mesmo com meus filhos na escola. Eu nunca fiquei parado em termos de aprendizado”. Fabio Bentivoglio sabe que estudar é importante e procura incentivar os filhos. “Eu digo que tem que estudar. Não estudei porque não quis, oportunidade eu tive. Minha mãe sempre deu oportunidade. Eu explico quanto tempo fico fora de casa. A gente tenta por na cabeça deles que a vida de caminhoneiro não é tão boa como parece. Para não ficar ultrapassado, procuro fazer cursos na área de caminhões e ler tudo o que consigo sobre transporte”. Mas como aprender mais se os caminhoneiros não conseguem ficar parados por muito tempo? A Secretaria Estadual de Educação de São Paulo mantém aulas com jornada flexível, nas quais o aluno não precisa estar presente todos os dias. Os cursos são organizados por semestre. Os interessados podem solicitar o “aproveitamento de estudos”. Assim, caso tenham realizado anteriormente cursos regulares de fundamental e médio, a escola pode definir quais termos ainda restam para a conclusão do ciclo. Para garantir o atendimento de todos, a Secretaria também ampliou o número de salas em todas as regiões do Estado. Para aqueles que dão preferência a uma carga horária mais flexível, a Secretaria mantém 31 unidades do Centro de Educação para Jovens e Adultos (Ceeja) em funcionamento na capital e no interior. Lá eles recebem um roteiro de estudos e vão à escola para tirar dúvidas com os professores e realizar as provas. A matrícula pode ser feita a qualquer momento. Todos docentes recebem capacitação especial para atender a faixa etária e propor aulas que dialoguem com a vida profissional e o cotidiano. Outro reforço é a distribuição do material “EJA - Mundo do Trabalho”, elaborado em parceria com Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia. O kit traz conteúdos sobre mercado, a história do trabalho no mundo e Brasil, e até orientações para elaboração de currículos. Para saber mais informações, ligue para 0800-7700012, a ligação é grátis, assim como os cursos. O futuro Preocupados com os problemas e perigos nas estradas, todos eles não esquecem os filhos e pensam em um futuro melhor para eles. “Falo para minha filha que se ela quiser ir para a faculdade eu vou ajudá-la”, diz Freitas Júnior. “Ela quer ser veterinária. Vou ajudá-la, mas eu cobro que tenha boas notas”. Para ele, a profissão do futuro é aquela que envolva computador e tecnologia. “Isso não vai acabar nunca”, comenta. “Eu gosto muito da minha profissão, adoro a liberdade das estradas. Ficar atrás de uma mesa é muito entediante”. E isso não é apenas da boca para fora. Freitas Júnior está parado há três dias, cozinhando no caminhão quebrado. “A comida no restaurante é muito cara. “Quando você faz o que gosta, faz bem feito. Estou aqui porque eu gosto da profissão. Se minha filha gosta de bicho, vai ser uma boa veterinária”. Paixão a gente não escolhe. E esse é o dilema de Fábio Bentivoglio. O filho, com apenas 10 anos de idade, já fala em ser caminhoneiro. “A gente não quer, incentiva para o outro lado. Explica que a vida não é apenas o caminhão bonito. Que tem os riscos das estradas, de assaltos, muita coisa ruim. Mas se quiser, não conseguiremos impedir”. Bentivoglio queria que o filho realizasse o seu sonho de criança, ser jogador de futebol. Até o colocou em uma escola de futebol.  “Ele joga muito bem”, diz o pai coruja. “Mas também gosta muito de bichos, poderia ser veterinário”. Bentivoglio explica para o filho que estudar é importante. Mostra quanto tempo fica fora de casa. “A gente tenta por na cabeça dele, que a vida de caminhoneiro não é fácil como parece”, diz. Angelim Monteiro Barreto não tem a preocupação com a escolha do futuro profissional dos filhos. Ambos já estão na faculdade fazendo agronomia e pedagogia. “No Chile, o ensino é melhor. Aqui no Brasil, os alunos não têm respeito pelos professores. O salário não é muito alto, mas tem vários benefícios”, compara Barreto, falando que preferia que seus filhos fossem funcionários públicos. Marcelo Melo, apaixonado pela sua profissão, gostaria que o filho fosse policial federal, mas diz que sentiria muito orgulho se o garoto escolher ser caminhoneiro, como o pai.

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